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quinta-feira, 20 de novembro de 2014


UMA MARATONA NO NORTE – MARATONA DO PORTO 2014

Depois da participação na Maratona de Lisboa em Outubro, uma nova “aventura” surgiu com o início de Novembro.

Na véspera, pelo início da manhã 4 autocarros estacionados no Campo Grande eram preenchidos por atletas. O destino era a cidade do Porto, O objectivo, a maratona.

A viagem foi uma relaxada deslocação com paragem na estação de serviço do Pombal.
Das conversas iniciadas sobre a corrida, família e política, passou-se para frases soltas e acenos de cabeça circunstanciais.
Começaram a surgir os primeiros phones nos ouvidos e tablets luminosos.

Nesta viagem aproveitei a companhia do Pedro R do Clube de Corrida. Fizemos uma planificação da deslocação e acomodação.
Através da internet apercebemo-nos que havia alguém a organizar uma deslocação colectiva ao Porto. Com a agregação de várias pessoas conseguia-se, talvez, um preço simpático para a viagem de ida e volta ao Porto. Nunca pensámos que sairia tão barato (12€50) e que seriam 4 autocarros. O problema da deslocação estava resolvido.

Ao longo da viagem fomos afinando os pormenores quanto ao levantamento dos dorsais, estadia e refeições.
Quase tudo foi conseguido excepto a questão dos duches pós corrida.

Por volta das 13H00, chegámos ao Porto, via ponte do Freixo.
A zona ribeirinha apresentava-se tranquila, um sol acolhedor fazia-se sentir e aqui e ali, turistas de mapa na mão admiravam o rio.

O local de estacionamento era excelente. À beira rio, mesmo ao lado da antiga alfândega do Porto e a 5 minutos da praça de táxis. Mesmo como convinha.

No entanto 4 autocarros ao mesmo tempo, traz sempre algum “congestionamento humano” e foi isso que explicou a demora no levantamento dos dorsais.
O edifício antigo, em pedra, mas remodelado, albergava todo os “serviços” da organização. Foi aqui que levantámos os dorsais e os activámos no sistema, recebemos todo o merchadising da corrida (mochila, tshirt, brindes dos patrocinadores, fotos instantâneas e panfletos promocionais das próximas maratonas e mapa turístico da cidade).

Chegámos a todo o lado e só não fomos ao almoço de pasta oferecido pela organização porque tínhamos uma refeição típica á espera.
Demorámos quase 1h nesta “busca” pelos dorsais e afins. A fome já apertava.
Mas de táxi foi um pulo até ao Campo Alegre e ao Capa Negra. E ai, meus amigos, demos cabo de umas francesinhas. Que categoria!

Com a gula saciada e o físico retemperado, iniciámos a 2ª parte do plano. “Assentar tenda”!
O plano era simples: íamos até à Rotunda da Boavista, apanhar o metro de superfície na casa da música até ao Bulhão, na Rua Santa Catarina e fazer o check in na residencial.

Correu tudo na perfeição excepto as máquinas dos bilhetes. Não aceitaram cartões multibanco.

Na rua muitos atletas com camisolas técnicas faziam o seu passeio vespertino.

A residencial tinha tanto de castiço como de acolhedor. Ficámos na “penthouse” e a quantidade de escadas e a inclinação das mesmas faziam doer a vista. A meio fazia-se o check in. Pelo sim, pelo não, também estava uma cadeirão, não vá as pernas fraquejarem.

Num pensamento rápido vislumbre-me no dia seguinte, quando viesse buscar as malas. Estas escadas iriam fazer miséria.
O chão de madeira “rabujava” sob o nosso peso. Era um prédio antigo.

Má noticia, o late check out e o merecido banho, depois da prova, só podia ser garantido até às 14h. Bom, teríamos que utilizar os duches da organização.

Com o check in feito e as malas arrumadas, fomos dar uma olhadela aos arredores e procurar sítio para jantar.

Ficámos numa zona simpática.
Central, perto de uma zona comercial movimentada (incluindo uma via fechada ao transito cheia de lojas e inclusive um centro comercial).

Com o início do crepúsculo, a temperatura foi descendo e serviu de desculpa para não termos ido à zona ribeirinha, aos clérigos e aos aliados.
Por sorte o centro comercial era grande. Deu para fazer a compra da fruta para amanhã e “despachar” um prato de massa, sempre útil para uma véspera de maratona.

Foi já nos preparativos para a corrida do dia seguinte, que o Pedro R. se apercebeu que tinha-se esquecido das meias de corrida. A única loja que encontrou aberta foi dos chineses e as meias, bem as meias ……não eram propícias para a prática desportiva! Aqueles pés iriam sofrer bastante amanhã!

Seria uma noite descansada. Calma e tranquila. Mas a excitação pela participação na prova, um travesseiro diferente e um gato com insónias tornaram a noite mais longa do que se previa. Mas não tardou a aparecer as primeiras luzes da manhã.

A meio do pequeno almoço apercebi-me que a divisão estava cheia. A residencial estava cheia de participantes da maratona. Parecia uma armada francófona!

7H15. Ponto de situação:
Indumentaria vestida, pequeno almoço tomado, fluxo intestinal regularizado. Próximo passo: ir para o frio e procurar um táxi. Ambas as coisas estavam “à mão de semear”. E assim foi no frio da manhã, que de táxi chegámos ao início da prova.

Tínhamos os Jardins do Palácio de Cristal como vizinhos. Os participantes eram uma multidão em constante movimento. Todos se preparavam para as 8H30. Os últimos xi-xi´s eram acompanhados por chá e café oferecidos pela organização.

Pusemos a nossa “bagagem” no autocarro da organização, fizemos o ultima aquecimento e entrámos no pelotão faseado existente para a ocasião. Colocamo-nos no grupo mais lento do pelotão. Não havia pressa (nem pernas) para velocidades maiores!

Mesmo antes do tiro de partida foi tirada a divisão que separava os últimos da maratona com os primeiros participantes dos 16 km´s (Family Race). Ponto negativo para a organização que até este momento estava impecável. Gerou-se alguma confusão. Fomos assim com acompanhamento extra logo no primeiro quilómetro.

Tinha combinado com o Pedro R. que cada um ia no seu andamento. Na chegada iríamos encontrarmo-nos na carrinha das bagagens ou se tivesse a chover nas instalações dos duches. E assim, logo nos primeiros quilómetros, abordei a contenda sozinho.

Os primeiros quilómetros iriam me levar até Matosinhos e ao Porto de Leixões. Algumas pessoas na rua puxavam por nós.

Depois da subida do início da prova chegámos à rotunda da Boavista e seguimos para o estádio do Bessa, zona residencial dos xadrezistas. Voltámos a avenida da Boavista e dai até ao Castelo do Queijo, passando pela entrada do Parque da Cidade (que seria o final da maratona).

É um luxo desta cidade: O rio e o mar, como vizinhos de “porta ao lado”. Foi assim que vislumbrei o mar entre a surpresa e a satisfação. Felizmente, o vento era fraco. E foi em velocidade moderada e prevista ( 6 minutos por Km), que dei de caras com as gentes de Matosinhos e as suas rotundas espaçosas.

O sol não aparecia e cada vez mais nuvens surgiam no horizonte.

A saída de Matosinhos coincide com a descida dissimulada para a foz. Achei a zona fantástica. Um jardim acompanhou-nos até a foz com uma vista fantástica e uma calma que parecia Domingo. Espetacular! Ao longo do jardim existia uma ciclovia para os turistas mais desportistas. Hei-de voltar a este lugar. De qualquer forma voltaria a visualizar tal local, na volta da maratona.

Circundei a costa “tripeira” e entrei na margem do rio Douro. O rio seria a minha companhia nos próximos 20 Km´s.

O itinerário de corrida foi extendido nos km´s seguintes e os atletas começaram a rarear. Passei por edifícios antigos, casas ao abandono e outras cheias de vida. Em frente, o azul do rio cruzava-se com o cinzento do asfalto. Era a parte (da maratona) mais solitária. Deu para pensar em muitas coisas inclusivamente, no que seria o almoço logo após o final da maratona!

Um pouco antes da metade da maratona, atinjo o primeiro abastecimento de sólidos. Até a esta altura não tinha falhado qualquer abastecimento de água. A temperatura era amena e o sol continuava coberto pelas nuvens.

Não necessitava, mas como estava curioso, servi-me das esponjas molhadas. Sim, dão jeito e diria um jeitaço em dias de calor. E dá um ar mais profissional a quem de fora nos vê a passar!

A isotónica era em copo, o que deixou-me algo enrascado por causa do solavanco da corrida. Fecharia o abastecimento com meia banana. Estava seguro até ao próximo abastecimento, até porque levava no bolso uns figos secos para desenrascar qualquer fome inesperada.

A passagem na ribeira foi a loucura. Entre os turistas e locais a aplaudir, as varinas davam palmadas nas costas de meter respeito! Logo a seguir utilizamos a lindíssima Ponte D Luís para passar para o lado de Gaia.

Já ia de olho nesse itinerário, quando fazia a margem norte do rio.
Até ao abastecimento dos 25 Km´s foi passar de esplanada em esplanada, sob olhares atónitos dos clientes. Bom local para o namorico….pensei eu. No verão à noite, deve ser fantástico estar por aqui, com as luzes do Porto a “pintar” as águas do rio.

O 25º Km foi atingido.
Continuamos na margem sul do rio. Passei pela Afurada e cheguei ao Cabedelo. Era hora de voltar!

Por esta altura os joelhos já gemiam de tanto passo dado. No resto, a máquina rolava sem solavancos.

No abastecimento dos 30 Km´s, ainda em solo Gaiense, servi-me de uma garrafa de isotónica e marmelada. Nunca cheguei a ver pacotes de gel (em toda a prova). Não cheguei a perceber se tinha chegado tarde ou se eles (os pacotes de gel) alguma vez foram disponibilizados.

Deixei a questão de lado, quando voltei a ver novamente a Ponte D Luís. A margem norte estava de volta. Seria o regresso à procedência.

Agora sim, iria ser a doer. Por causa dos quilómetros já percorridos, pelos quilómetros que ainda faltavam percorrer e pela solidão que seria os próximos quilómetros.

Por ser o caminho de volta, inconscientemente, tentei aumentar a velocidade, de forma a chegar mais depressa à meta. Mas ainda faltavam muitos quilómetros.

35º Km, o abastecimento do “vai ou racha”. Entre a fruta, as águas e isotónicas e as esponjas, havia aqueles que se sentavam, outros que se deitavam, os que gemiam e outras que cantavam.
Entre a lucidez e a loucura, todos partilhavam as agruras da corrida.
Numa tenda de campanha da Cruz Vermelha alguém protestava. Isto é uma guerra!

Voltei a estrada, voltei à batalha.

Cada vez mais lento, tendo havido alturas em que a corrida e a marcha se confundiram, passei novamente pela foz do Douro, o jardim que antes me tinha parecido um paraíso. Agora, e com toda a minha fúria, queria deixa-los pelas costas.

Queria os 42 Kms, queria a meta, queria acabar!

A capacidade cardíaca estava funcional, mas os joelhos……..era um suplício.

No abastecimento dos 40 Kms, fui buscar uma garrafa de água, só para me entreter e me esquecer das dores.

Mas quando levei a garrafa à boca e olhei o horizonte, com Matosinhos lá no fundo, encontrei um céu negro, da mesma cor do asfalto que pisava.

Vinha lá tempestade!
E veio rápido demais, sem aviso e sem misericórdia!

2 Km´s feitos entre relâmpagos e trovões, chuva e vento.

Não merecíamos!

A meta, mais que o final da prova, era “porto de abrigo”.

Com o relógio a apontar as 4h30, cheguei, acenei, parei e refugiei-me por debaixo do toldo das imperiais. A chuva era tanta que fazia subir o nível do copo de cerveja. Já não era cerveja, era água com cevada!

                                           (Com a historia da chuva só me lembrei de desligar o relogio já la iam 4H48!)

Queria sentar-me, queria tirar a roupa molhada, queria um banho quente, queria comer, queria…………………

O raciocínio prático surgiu logo a seguir a ter deitado a cerveja fora.
Num pulo, fui buscar o meu saco de pertences ao autocarro da organização. E de seguida procurei abrigo. Encontrei um lugar livre, entre 2 prédios, mesmo ali ao pé.

A chuva era tanta que não me aventurei a percorrer a distância que separava dos duches.
E com isso, não consegui encontrar-me com o Pedro R.

Era altura de fazer ponto de situação e elaborar um plano de contingência.
A chuva e o facto de o autocarro de regresso partir as 17H, fez-me abdicar do duche.  Não era tão relevante, afinal foi tal a molha que tinha apanhado, que na verdade, só faltou o shampoo.
A muda de roupa estava garantida e ainda bem que tinha uma toalha no saco. Foi assim que me sequei e mudei de roupa ao pé de tantos outros.

O telemóvel, a carteira e tudo o resto tinha ficado na residencial.
Como iria resolver esta situação? Sentei-me a descansar e a comer uma barra energética. Perdia o meu olhar na garrafa de vinho do porto oferecida a todos os finishers da maratona.

Lembrei-me das moedas que tinham-me sobrado do táxi da manhã. Estes trocos tinham de dar para chegar ao bulhão.
Sabia de antemão que o metro de superfície não chegava ao jardim da cidade, onde me encontrava.
Estava na hora de me desenrascar. Aquela hora já não havia autocarros providenciados pela organização, directos ao centro da cidade.

Foi com esperança que vi um autocarro parado numa paragem. E foi lá que eu iniciei o regresso. Os trocos deram para ir até a estação de metro mais próxima (Sete Bicas).De lá fui directo à estação do bulhão. Estava a chegar ao destino.

Começou novamente a chover. Felizmente a residencial era já ali.

Como imaginei na véspera, subir a escadaria da residencial não foi fácil. E quando cheguei ao tal cadeirão, para um descanso merecido, encontrei-o ocupado por um gato gordo, tresmalhado e sonolento. Então este tinha sido um dos causadores da minha noite intermitente! Em forma de vingança dei-lhe uma sapatada e destronei-o do trono. Estávamos quites.

Felizmente consegui contactar o meu colega de viagem, que entretanto já me tinha tentado contactar. Tinha tido mais sorte que eu. Como tinha acabado mais cedo, tinha conseguido fugir a chuva e tomado um duche quente.

O tempo apertava e sabendo que a viagem de metro entre o bulhão e a casa da música era directo e rápido, ainda fomos ao centro comercial almoçar. Coisa ligeira! É que ainda tínhamos um longo caminho de regresso até Lisboa.

Até à próxima cidade do Porto!









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