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quarta-feira, 17 de julho de 2013

10 kms de Vila Nova de Santo André

O Ocaso de Zé&Mi?

(diálogo entre duas metades de um ser imperfeito*)


*Para entenderem este texto tenho que fazer uma introdução ao meu petit nom. Nasci José Emílio, típico português, o primeiro nome de herança hebraico-cristã e o segundo de tradição romana (momento Canal História). No dia do meu nascimento o meu avô paterno “batizou-me” logo de Zémi, street name que usei até ao final do ciclo, 11 anos. Portanto, e pese embora hoje em dia quase ninguém me chame assim, Zémi sou eu! 

Depois de ultrapassar o exército de Sobreiros e Azinheiras que se encontra acantonado na Serra de Grândola, a zona de Santo André e Melides recebe o visitante com um forte abraço verde do pinhal que o envolve e desemboca nas suas múltiplas lagoas, separadas de praias infinitas por dunas de vegetação autóctone coroadas. É um dos últimos locais em Portugal onde se consegue fazer praia num ambiente praticamente intocado pelo homem.

Mas não se pense que a paisagem humana parou no tempo. As vilas e aldeias não são meia-dúzia de casebres caiados povoadas por alguns sexagenários semiabandonados, como noutras zonas do país. O dinamismo ao redor da “terra da fraternidade” trata bem do “povo que mais ordena”. O progresso também chegou a este local, quer nos bens e serviços oferecidos pelo comércio local, mas também nas zonas de apoio balnear que se encontram perfeitamente enquadrados na paisagem. Utilizando materiais…

Mi: “Oh… oh… oh… Zé pára lá com isso! Eu sei que és um lírico, mas isto não é o canal Odisseia nem estamos no momento National Geographic. Queres fazer documentários? vai para a RTP2! (ias)”

Zé: “Está bem, está bem, eu vou avançar. Bom continuando…”

Tinha planeado trazer a família para um fim de semana calmo nesta zona do país, aproveitar para fazer a corrida, ir à praia e provar algumas das pérolas gastronómicas nativas, não necessariamente por esta ordem. Tinham-me recomendado o restaurante Tia Rosa dos Patos em Melides, mas o adiantado da hora no dia de chegada fez-me interromper a sua procura, no centro de Melides, quando encontrei… “O Melidense”.

“O Melidense” é um restaurante… bom, não é bem um restaurante, é atascado, com decoração de tasca, com bancos e cadeiras de tasca, com um atendimento muito informal, à tasca, mas com um menu de pratos tradicionais que apetece experimentar e saborear lentamente, como se fossem os longos capítulos saborosos de um livro de verão.

Desde a sopa de beldroegas, à sopa de tomate com ovos escalfados (ambos por provar), passando pelo arroz malandrinho de frango com hortelã até às febras de coentrada… e as farófias… Bom, por alguma razão o Alentejo, para além de ter inquestionavelmente das melhores paisagens, é indubitavelmente a zona do país onde se come melhor.

Mi: “Mau! Estás a dar uma de guia turístico? ZÉ, olha para o cabeçalho desta folha! Vês algo referente a gastronomia? Não vês, pois não? Isso é porque isto não é um blog de culinária mas sim sobre actividade desportiva! PERCEBESTE?”

Zé: “Então também não posso falar nos pequenos-almoços triplos do hotel? Com croissants recheados…”

Mi: “NÃO! …mas espera tu comeste pequenos-almoços TRIPLOS, quando andas a querer perder peso para correr mais longe e mais depressa?!?!?!?”

Zé: “Bom, e mudando de assunto…(sai de fininho)”

A prova de Santo André, efectuada todos os anos sob uma luz crepuscular de verão, encerra o troféu anual da CGD, onde participo sem qualquer ambição competitiva, e por esse motivo nem mesmo a distância de Lisboa impediu que cerca de 20 colegas estivessem presentes.





No dia da corrida, fui o último a chegar para levantar os dorsais, tendo sido recebido com um olhar misto de desilusão e desaprovação do André (não o Santo, o Noronha). Logo na primeira prova depois de ter recebido o guia de boas práticas da secção de atletismo a recomendar que os praticantes cheguem ATÉ uma hora antes da partida (e não 45 minutos antes). Autorrecriminei-me…

Arranquei para o aquecimento, mas não fui capaz de pôr o GPS a funcionar por falta de bateria no relógio. Ajuntei-me com os outros corredores e… Partida.

Os 2 primeiros kms, a saída da praia até ao pinhal a subir cerca de 50 metros, foram feitos em 10’15’’, com intensidade, pois sabia que fazer aqui um ritmo forte era essencial para conseguir um bom tempo final. Ainda tive que correr em cima do passeio lateral, a fazer sinais com os braços, para que a Susana (minha mulher) me visse e tirasse uma foto.

Pelo que sabia que o 3º km seria para recuperar um pouco o esforço da subida, ainda assim sentia-me bem até que um colega corredor chama a minha atenção para o meu pé esquerdo.

Mi: “Que erro estúpido de iniciado! Tiveste que parar uns cinco a dez segundos para atar os atacadores. Para a próxima dá dois nós!”

Zé: “Mi… tu também paraste! E isso só aconteceu porque o menino Mi é um impulsivo e quando viu tanta gente a aglutinar-se junto ao portal de partida esqueceu-se de tudo o resto.”

Mi: “Zé, estás-te sempre a desculpar…”

Zé: “E tu Mi pareces uma mulher, sempre a reclamar, reclamar, reclamar…”

Bom, para o 4º km ia com boa média (para o meu ritmo claro), e passo pelo Marcolino, o primeiro da Caixa a passar já no sentido da chegada, resolvo gritar o nome dele para o motivar, mas ele antecipa-se e a motivação acaba por ser mútua.

Ao 5º km dá-se a viragem de uma descida para relaxar os ombros, para o regresso numa subida ingreme com abastecimento. Se no início da subida vejo o André a descer do outro lado, na subida, o André com uma passada naturalmente mais leve, passa por mim. Depois da rampa…



Mi: “Zé, lembra-me de quando voltarmos aos treinos irmos fazer rampas, para não perdermos o ritmo nas subidas. Desculpa a interrupção, podes continuar.”

Depois da rampa, o 6º e 7º km devem ter sido o período mais difícil para mim, sem tempo para recuperar o folego, logo a seguir entrámos pelo pinhal de terra batida com uma camada de areia, o suficiente para os ténis deslizarem um bocadinho. As vozes dentro da minha cabeça pediam-me para parar de correr, mas por orgulho não o fiz.

Dispensei o segundo abastecimento de água, e ao 8º km tinha cerca de 40’50’’. Estava acessível um bom tempo final, mas não podia ir agora abaixo se o quisesse atingir. Aumento a intensidade da passada, em grande parte motivado por um cão/cavalo que se encontrava solto a ladrar e a correr, mas que felizmente não conseguia decidir qual dos corredores iria morder.

Continuo a forçar a passada para fazer o 9º km com bom tempo, mas a respiração torna-se difícil de controlar. Pese embora ainda os tenha utilizado como lebre durante uns trezentos metros, um casal de sexagenários ultrapassa-me a bom ritmo, e atenção, era ela a liderar as operações.

O último quilómetro começa com uma dezena de populares aos gritos com placares a dizer “Força Zé, és o nosso campeão!”, o que me encheu o ego e acelerei outra vez.

Mi: “Mas afinal o Zé era outro… ou eles gritavam a todos… enfim chapéus há muitos.”

Zé: Por fim, a longa descida até ao portal de chegada torna mais fácil, não só manter um bom ritmo, como também a libertação da adrenalina acumulada durante a corrida através de um sprint final.

Chegado ao carro a Susana nota que tenho duas manchas de sangue à volta dos mamilos, resultado da fricção da camisola durante uma hora, para cima e para baixo.

Mi: “Segundo erro de iniciado!!! Mas eu não te ensinei a usar pensos rápidos ou a pôr vaselina nos mamilos???”

Resultado final, 51’55’’ no relógio e 52’12 no chip, a diferença são os 17 segs. que levei a passar a partida. Novo record pessoal numa prova que, pela irregularidade do terreno, não tem perfil de ser das mais rápidas. A ser assim, foi um excelente tempo com premonições de novos records em pistas planas. Venha o início de uma nova temporada em Setembro!

Notas finais:

1 - FIQUEI À FRENTE DA SOFIA NO TROFÉU CGD!!!! (resultados não oficiais)
MUAHAHAHAHA (ler com entoação de riso maquiavélico de um cientista maluco com o cabelo em pé...conhecem algum? Eu conheço.) Toma toma toma.

Não, não, não, agora a sério, longe de mim ser assim competitivo e comportar-me assim de forma infantil...estava a brincar evidentemente.

2 - Espero que o meu estilo a correr não seja este.





3 – Depois da corrida, nos dias seguintes, fiquei com uma dor persistente na zona da cintura. Será que tenho uma lesão prolongada?

Não percam os próximos capítulos da telenovela Zé&Mi – duas metades de um ser imperfeito… que eu também não.

5 comentários:

  1. Um dos melhores posts que li.
    Pró ano vais ter a minha companhia .....e eu vou chatear-te o espirito a corrida toda.

    Esta historia do Zé&Mi está a justificar um livro autobiografico!

    Em relação ás rampas & subidas..........vamos tratar disso!
    Cão/Cavalo.............NTGeo a mais.......é o que é....

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    1. Obrigado pela critica... Para o ano vês-me pelas costas :p

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  2. Zémi ... Zémi ...
    A leitura estava a correr tão bem... Até áquela frase em Caps Lock!
    Competitivo?! Infantil?! Nada disso...!! :) :) :)
    Não perdes pela demora!! :)
    Põe-te bom!

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    1. ai ai ai a minha vida! :):):)

      Obrigado.. em breve haverá novidades.

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  3. Saíste-me cá um cromo... :)

    Mais um excelente post!

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